Claúdio Salles
CONVERSAS ANTROPOFÁGICAS
Na próxima sexta, 17 de agosto de 2018, o PPGA UFF - Programa de Pós Graduação em Antropologia inicia o projeto CONVERSAS ANTROPOFÁGICAS, com a participação do antropólogo Ronaldo Lobão (PPGSD-UFF) , Edson Pereira da Silva (doutorado em Genética pela University of Wales-Swansea e pós-doutorado em Genética Molecular ) e Jorge Nunes (Seu Chico) Presidente da Associação Livre dos Pescadores e Amigos de Itaipu . O evento terá início às 17:30h, na sala 231, do Bloco " P " do Campus do Gragoatá da UFF, em Niterói - RJ.
JOSÉ COLAÇO NO VIVA A CIÊNCIA
O programa Mundo Universitário, da Cândido Mendes de Campos, entrevistou essa semana o antropólogo José Colaço, pesquisador vinculado ao INCT/InEAC. Ele falou sobre o Neanf e a participação no Programa de Iniciação Científica VIVA A CIÊNCIA, da Prefeitura de Campos. Assista a matéria acessando o link : https://www.youtube.com/watch?v=CNkCszEVeIw
"PCC não tem dono. É uma fraternidade do crime"
O site do INEAC reproduz aqui a entrevista com o sociólogo Gabriel Feltran, professor da Universidade Federal de São Carlos e diretor científico do CEM (Centro de Estudos da Metrópole) da Universidade de São Paulo, intitulada "PCC não tem dono. É uma fraternidade do crime", publicado no site uol.com.br
Nem uma empresa do crime ou apenas uma estrutura de caráter militar. Maior facção criminosa do país e presente em todos os estados, o PCC (Primeiro Comando da Capital) é uma fraternidade. Uma sociedade secreta cujo objetivo principal é o progresso de seus irmãos (membros) e voltada para a "luta violenta e silenciosa contra o sistema".
Esta é a visão do sociólogo Gabriel Feltran, professor da Universidade Federal de São Carlos. Ele é autor do livro recém-lançado "Irmãos --Uma História do PCC" (Companhia das Letras), no qual traça um panorama da trajetória do grupo criminoso fundado por oito detentos no Anexo da Casa de Custódia de Taubaté (SP), há quase 25 anos . A obra é baseada em uma pesquisa de campo feita nas últimas duas décadas pelo autor na periferia de São Paulo.
"Oferecendo aos presidiários uma ordem previsível para a vida cotidiana, o PCC ganhou respeito e o consentimento ativo da massa prisional em São Paulo", escreve Feltran. E partir das prisões, a facção passou a exercer uma hegemonia nas ruas, atuando como uma espécie de "agência reguladora do crime".
Leia abaixo a entrevista por email que o sociólogo concedeu ao UOL:
UOL - Em seu livro, você afirma que o PCC é uma "fraternidade do crime" com aspectos semelhantes à maçonaria. Em sua visão, quais são as características que diferem o PCC de outras facções criminosas?
Gabriel Feltran - O PCC não tem dono nem chefe, nem um general.
É uma sociedade secreta fraternal, com posições hierárquicas e despersonalizadas de autoridade, em geral chamadas de 'sintonias'.
Essa estrutura incorpora as funções militar e de mercado sem se confundir com elas. Fraternidades como a maçonaria nos dão uma metáfora mais simples para entender isso. O fato de um maçom ser empresário não faz da maçonaria uma empresa. O fato de ele ocupar a posição de venerável de uma loja não o autoriza a mandar em outro irmão.
Há muitos empresários maçons, grandes e pequenos, de muitos ramos da economia, além de outros irmãos que não são empresários. Não há estrutura centralizada de mando, mas princípio de apoio mútuo entre irmãos. Ninguém divide o lucro da sua empresa com a maçonaria, mas ajuda a fortalecer a fraternidade e seus princípios de outras formas. Assim também no PCC.
Não conheço outros grupos criminais que atuem assim; em geral, são redes étnicas, empresariais ou militares.
Por que usar metáforas como "empresa do crime" ou de uso militar é insuficiente para compreender o que é o PCC?
Há muitos empresários ligados ao PCC fazendo comércio local ou transnacional de drogas e armas, atuando também nos mercados de veículos, fazendas, hotéis, postos de gasolina, fronteiras, portos etc.
O PCC pode realizar ações de tipo militar como resgates, execuções ou assaltos tão sofisticados quanto uma operação de guerra.
Uma sintonia específica pode até atuar como uma empresa, sem dono, nos moldes de uma estatal. Outra pode ser focada em treinamento militar. Mas essas partes não são o todo da facção. Ninguém manda em ninguém, nem divide seus lucros com a irmandade.
Qualquer irmão, rico ou pobre, preso ou na rua, tem os mesmos princípios a defender no mundo do crime e a mesma disciplina a considerar, ainda que saia do crime.
São fundamentalmente três. Em primeiro lugar a pujança da economia ilegal na América Latina, a partir dos anos 1980, quando os mercados de drogas e armas ganham escala global. Isso expande o crime em geral, não apenas o PCC.
Em segundo lugar os equívocos das nossas políticas de segurança --de governos, judiciário e do debate público--, que focam na guerra contra pequenos operadores em vez da regulação desses mercados. Temos agido por instinto mais do que com inteligência nessa área. Punimos as pessoas enquanto incentivamos as facções, que ganham milhares, milhões de integrantes. Assim, saímos de 40 mil presos no início dos anos 1990 para 240 mil hoje no estado de São Paulo, com 1 milhão de ex-presidiários. Nos outros estados importou-se esse modelo, uma máquina de fazer bandido e desigualdade. No país, já são milhões de pessoas convivendo diretamente com o mundo do crime.
Em terceiro lugar, a forma singular do PCC atuar como uma fraternidade que prioriza as alianças aos enfrentamentos entre os pobres, para fortalecer sua guerra contra "o sistema".
Por que você considera que no ano de 2002, quando Marcola obteve vitória sobre adversários Cesinha e Geleião, aconteceu uma "revolução" na história da facção?
Porque ela quebra o modelo piramidal de organização, com poder personalizado e estrutura de mando, para fortalecer a forma igualitarista da irmandade, com posições de poder despersonalizadas e sintonias independentes. Esse modo de agir é muito mais difícil de reprimir, equaciona política e economia na facção de modo totalmente diverso de outros grupos criminais, o que facilita demais a expansão do PCC nos últimos 15 anos. É uma passagem decisiva.
Você afirma que o PCC não tem uma estrutura de mando. Nesse sentido, qual é a posição ocupada por Marcola dentro da facção? Por que, em sua opinião, não existe a figura de chefe do PCC?
Existem pessoas que pela sua "caminhada" no crime, como se diz, têm o respeito dos outros bandidos. Mas elas não podem mandar em ninguém, pela própria lógica que as fez terem prestígio. Elas são referências para os outros ladrões e, ao mesmo tempo, ninguém é mais que ninguém nesse universo. Há outras formas de organizar uma coletividade que não a estrutura de mando, do poder personalizado, que nos é mais familiar. Para o bem ou para o mal, elas existem.
Mesmo que o número de membros do PCC seja reduzido em uma determinada prisão de São Paulo, as regras da facção são obedecidas pelos demais presos. O mesmo vale para pontos de drogas que não geridos por membros da facção. O que significa dizer que a "cadeia e a rua correm no ritmo do PCC"?
Não são regras sendo obedecidas. Para quem é da facção esse é o certo, o correto, mesmo que na vida errada. É diferente.
Uma cadeia que tem 1.300 presos pode ter apenas 50 irmãos batizados e ser considerada toda uma cadeia 'do PCC', porque os demais presos concordam, aceitam ou ao menos toleram o ritmo do PCC, a disciplina do comando um dia depois do outro dia.
Uma quebrada com 10 mil pessoas pode ser considerada "do PCC" mesmo que haja só meia dúzia de irmãos batizados ali. Muita gente que é do crime não é irmão batizado do PCC, mas, como se diz, corre com o comando. Porque considera que é mais certo assim, não porque é obrigado a isso. Queiramos ou não, é assim que tem funcionado.
Você afirma que nas favelas e nos bairros periféricos funcionam e coexistem três redes de influência muito poderosas: a do crime, a estatal e a religiosa. Como elas interagem?
Interagem no cotidiano, nas necessidades do dia a dia. Se uma pessoa tem um filho no crack, a igreja tem uma clínica de internação; é o que ela conhece, o pastor e os irmãos da igreja podem ajudar. Se um familiar teve problemas com a Justiça, um advogado conhecido pode auxiliar. Se ela teve sua moto roubada, é mais certeiro se reportar ao mundo do crime do que à polícia na tentativa de recuperá-la.
São redes de poder que atuam ao mesmo tempo, não necessariamente uma contra a outra sempre. As três se expandem nas últimas décadas. Por isso há hoje religiosos, policiais, militantes e bandidos com influência política e negócios relevantes nas periferias.
A tese de que o PCC monopoliza o tráfico de drogas em São Paulo não se sustenta, em sua opinião. Por quê?
Por várias razões. Primeiro porque o PCC não é uma empresa. Depois porque todo o tráfico nas classes médias e elites não é regulado pela disciplina da facção. Também porque há muitos pontos de venda de droga nas periferias que não são operados por irmãos batizados no comando. Esse é um mercado enorme, transnacional, muito diversificado e difícil de monopolizar. Não quer dizer que empresários ligados ao PCC não tenham vontade de monopolizar redes de tráfico. Mas hegemonia política é uma coisa, monopólio econômico é outra.
Como definiria o impacto das ações da facção nas dimensões legais e ilegais em mercados como o de carros roubados?
O mercado de veículos é um ótimo exemplo da interface legal-ilegal. Há 500 mil veículos roubados no Brasil todos os anos, abastecendo os setores de autopeças, revenda, leilões, seguros e outros ramos regulares, oficiais e fortes da economia nacional. Claro que esses ramos trabalham majoritariamente com veículos legais.
Ou seja, legal e ilegal se misturam e o dinheiro obtido com um carro roubado retorna como desenvolvimento econômico desses mercados; gera violência de um lado e emprego legal de outro. Da mesma forma, veículos são trocados nas fronteiras por armas e drogas, retroalimentando a economia ilegal que vira consumo, dinheiro, mas também novo ciclo de violência.
Temos estudado essas interfaces com detalhe numa rede de pesquisa ampla, internacional. A presença das facções na regulação dessas economias é relevante.
O PCC assumiu o papel de institucionalizar um tipo de justiça que já ocorria nas favelas antes de sua existência. Como isso aconteceu e como a facção aplica essa justiça?
O PCC reforça e organiza uma forma de justiça popular cujos valores já existiam nas periferias muito antes dele. Uma justiça comunitária, sem mediação da lei oficial, alheia ao Estado. Antes da hegemonia do PCC em São Paulo havia muitos justiceiros, grupos de extermínio e linchamentos. Também eram formas de justiça popular.
O PCC age contra essas práticas ativamente, combate os justiceiros em cada quebrada e reivindica para si o monopólio da violência e da justiça popular. Isso é muito conhecido nas cadeias e favelas do estado de São Paulo.
Quais são os erros cometidos pelo Estado brasileiro que permitiram que o PCC conquistasse uma hegemonia política sobre parte tão significativa da população?
As pessoas querem paz e justiça, vindas de onde vier. Os mais pobres também. Quando a gente anda por muitos anos nas favelas, isso é evidente. A justiça oficial não esclarece sequer os homicídios nas favelas. Se o fizer, será depois de sete, oito anos. Seu filho é assassinado, você sabe quem matou mas as autoridades não investigam. As facções o fazem.
Outro exemplo: muitos jovens favelados são inempregáveis exceto no tráfico, que os acolhe e os permite ter renda. Às vezes são coisas até muito mais básicas: ter uma pasta de dente ou um sabonete na cadeia. O crime permite isso ao cara, porque nós não conseguimos ou não queremos permitir.
Então não precisa ser de direita nem de esquerda para entender que as pessoas querem coisas básicas. Segurança é uma delas. Quando não tem de um lado, busca-se de outro.
Quais são hoje os objetivos do PCC? Considera que a facção pretende ter representantes parlamentares, por exemplo?
Os mesmos objetivos de sempre: progresso para os irmãos e suas famílias através do crime, do mundo do crime. Não do trabalho. Difícil de entender para nós, mas lógico para a minoria que vive esse universo.
O resto, na visão da facção, são meios para isso. Conquistar mais mercados, mais portos, fronteiras e aeroportos, mais armas e tecnologia, mais redes internacionais para ações criminais é um meio para esse progresso.
O PCC não é um partido político nem quer integrar nosso sistema político. Não acredita nisso, embora precise corromper agentes do Estado para favorecer suas ações. Não se admitem agentes penitenciários, policiais ou outras autoridades batizadas na facção. Isso não existe. De outro lado, bandidos no parlamento não seria uma novidade, no nosso caso.
SEMINÁRIO DIREITO AO CORPO NA CIDADE: Sobre os Cárceres Corpóreos e os Mapas de Ação
DIFUSÃO CIENTÍFICA: INCT INEAC cresce nas redes sociais
O INCT InEAC tem se dedicado a divulgar os trabalhos dos seus pesquisadores associados e vem investindo na popularização da Difusão Científica através do LEMI - Laboratório Estúdio Multimídia do INEAC e também da divulgação de conteúdos pelas Redes Sociais. Confira, no anexo disponível para download, o crescimento da presença do INCT InEAC no facebook, através dos gráficos comparativos sobre curtidas, visualizações, seguidores e alcance das publicações. A amostragem é relativa ao período dos últimos de 12 meses da página do INEAC no facebook.
INCT-InEAC assina nota de apoio ao projeto "Lesbocídio: as histórias que ninguém conta"
O INCT-InEAC assinou a nota de apoio ao projeto "Lesbocídio: as histórias que ninguém conta" desenvolvido no âmbito do IFCS/UFRJ. O mesmo está sofrendo inúmeros ataques que buscam deslegitimar a pauta LGBTI+ em nosso país. Estes ataques deixaram de ser apenas publicações em redes sociais e passaram a incluir denúncias caluniosas contra a metodologia da pesquisa e a coordenadora do projeto a professora Maria Clara Marques Dias.
O texto da nota encontra-se disponível por meio do link https://goo.gl/forms/7eI7ZfzEqw3QiEhv2 para sua leitura e apoio, tanto de instituições, coletivos, partidos e quaisquer outras organizações ou pessoas físicas.
A Segunda Vida do Hotel Bandeirantes
O site do INCT InEAC publica o Vídeo de apresentação da Ocupação Hotel Bandeirantes, situada na zona portuária do Rio de Janeiro. Este vídeo foi produzido no âmbito do projeto Luta Pela Moradia No Centro Da Cidade, pesquisa etnográfica de 4 anos comparando diversos modelos de habitação de interesse social na região central do Rio de Janeiro. Ela envolve uma equipe de 8 pesquisadores internacionais provindo de 3 universidades : Syracuse University (New York), King's College (Londres) e Universidade Federal Fluminense (Rio de Janeiro). Câmera, som e edição : Émilie B. Guérette www.emiliebg.com
Para acessar o vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=y35Im6rtPag&feature=youtu.be
O Rio de Janeiro Continua Lindo?
O site do INCT InEAC publica o link para o vídeo "O RIO DE JANEIRO CONTINUA LINDO", Este vídeo é parte de uma pesquisa sobre Direito à Moradia na Zona Portuária do Rio .
A Zona Portuária do Rio de Janeiro, alvo de transformações urbanísticas radicais nos últimos anos, é um espaço de luta e de resistência popular. Este vídeo apresenta diversos projetos de moradia de interesse social, junto com movimentos de defesa do direito à moradia que atuam nessa região. Foi produzido no âmbito do projeto Luta Pela Moradia No Centro Da Cidade, pesquisa etnográfica de 4 anos comparando diversos modelos de habitação de interesse social na região central do Rio de Janeiro. Ela envolve uma equipe de 8 pequisadores internacionais provindo de 3 universidades : Syracuse University (New York), King's College (Londres) e Universidade Federal Fluminense (Rio de Janeiro).
Câmera, som e edição : Émilie B. Guérette www.emiliebg.com
Para assistir acesse o link abaixo.
https://www.youtube.com/watch?v=CrddgMYjm5c&feature=youtu.be
Escritos sobre Direito, Cidadania e Processo: Discursos e Práticas
Na falta de inteligência, mais violência
A revista ISTO É publicou, no último dia 20 de julho de 2018, matéria intitulada "Na falta de inteligência, mais violência" . A reportagem escrita pela jornalista Luisa Purchio traz a participação do antropólogo Roberto Kant de Lima , coordenador do INCT INEAC, confira ! https://istoe.com.br/na-falta-de-inteligencia-mais-violencia/
Na falta de inteligência, mais violência
Estudo mostra que o número de tiroteios, homicídios e chacinas cresceu no Rio de Janeiro nos cinco meses de intervenção federal — e que a presença de soldados nas ruas não se reflete em melhoras na segurança pública
Quando o presidente Michel Temer assinou o decreto que colocou as Forças Armadas no comando das polícias Civil e Militar do Rio de Janeiro, em fevereiro, os especialistas já alertavam que a intervenção teria poucos efeitos sobre a segurança pública. Considerava-se que a iniciativa era mais motivada para aumentar a popularidade do presidente do que para restaurar a ordem. Os números que provam essa suspeita começam, enfim, a aparecer. Exatos cinco meses depois da intervenção, se algo mudou foi para pior — e o que se vê no Rio é um cenário de guerra. As notícias de tiroteios e mortes de bandidos e PMs são praticamente diárias, fazendo com que a paz pareça cada vez mais distante.
SEM SAÍDA Homens com fuzis na Vila Cruzeiro (acima) e a UPP do Morro do Alemão (abaixo): cinco mortos em confronto com policiais (Crédito:Divulgação)
Um levantamento divulgado esta semana pelo Observatório da Intervenção, grupo da Universidade Cândido Mendes, mostra que a violência no Rio aumentou de fevereiro a maio de 2018 em relação ao mesmo período do ano anterior. Os tiroteios e disparos cresceram 37%. As chacinas aumentaram 80%, enquanto as mortes em chacinas dispararam: 128%. Enquanto isso, a apreensão de fuzis, metralhadoras e submetralhadoras caiu 39%. “Nossa impressão é que muitos recursos têm sido gastos em operações grandiosas que geram resultados inexpressivos”, afirma Silvia Ramos, cientista social e coordenadora do Observatório. “Há o risco de o Exército ficar desmoralizado. Achamos que eles deveriam investir em inteligência, investigação e reestruturação das forças policiais”, diz ela.
Sem metas nem cronograma
Os relatos de violência contra civis e policiais só crescem. Apenas na semana passada, diversos casos foram registrados. Moradores do Morro do Urubu, na Zona Norte do Rio, passaram a noite de segunda-feira 16 e a madrugada da terça em meio a trocas de tiros motivadas por disputas de poder entre facções criminosas. Na mesma noite, quatro pessoas foram encontradas mortas em Senador Camará, bairro na Zona Oeste do Rio. Na madrugada da quarta-feira 18, na comunidade de Cidade de Deus, um soldado do Exército foi baleado enquanto patrulhava com um grupo as imediações do local. O final de semana anterior não foi mais pacífico. No início da manhã do domingo 15, cinco homens foram mortos por PMs da Unidade de Polícia Pacificadora do Alemão, na Serra da Misericórdia, que liga o Complexo do Alemão ao Complexo da Penha. No dia seguinte, mais um tiroteio impediu os moradores de saírem de suas casas.
Diante da situação atual, virou uma missão quase impossível para o interventor Walter Braga Netto transformar o Rio de Janeiro em um lugar menos violento do que encontrou. A intervenção termina no dia 31 de dezembro e tem se revelado um fracasso de planejamento. Braga Netto assumiu o comando das polícias de um estado falido por anos de corrupção e administração irresponsável de recursos públicos, mas não apresentou metas, um cronograma de ação e nem sequer uma prestação de contas. “Qual será o legado da intervenção?”, questiona Antonio Carlos Costa, presidente da ONG Rio de Paz. Para ele, o morador da favela está enterrando seus filhos sem ter nem como conhecer os protocolos de operações das Forças Armadas. “Não se sabe se o militar vai entrar na casa dele ou se seu direito de ir e vir estará assegurado”, afirma Costa.
O Exército pouco tem feito para combater as razões estruturais da insegurança na cidade. Um dos motivos que permitem o avanço da criminalidade é o aumento do poder das milícias, grupos compostos por ex-policiais e agentes do estado que vendem serviços ilegais à população, intimidada a contratá-los. A intervenção tem sido incapaz de mudar esse quadro. Pesa também a favor do aumento de homicídios e chacinas a disputa entre facções criminosas no estado, cada vez mais sangrenta. Adversário do Comando Vermelho, o PCC, que controla os presídios de São Paulo, tem reforçado sua presença no Rio de Janeiro, onde também pretende dominar o tráfico de drogas.
“Essa guerra é travada em espaços da pobreza, onde quem morre em proporções absurdas são os pobres e os soldados, o chamado ‘andar de baixo’ da população e das instituições”, diz Roberto Kant de Lima, coordenador do Instituto de Estudos Comparados em Administração de Conflitos, da Universidade Federal Fluminense. “O que falta é inteligência. Enquanto só houver violência e repressão e pouca investigação criminal, mais mortes acontecerão, inclusive de pessoas inocentes — que na guerra representam apenas ‘danos colaterais’”. Sem inteligência, sobram vítimas.