Roberto Kant de Lima
Publicado na revista ISTO É
InEAC na Mídia
Lenin Pires
Publicado no Jornal O Globo
Esta segunda coletânea de monografias do curso de especialização em Justiça Criminal e Segurança Pública, ministrado na UFF, reúne reflexões empreendidas por policiais militares e civis, jornalistas e cientistas sociais. Esta pluralidade de olhares está intimamente vinculada à própria composição do curso, propositadamente construída para permitir a explicitação e o respeito às diferenças, fundamental para a atuação democrática das instituições que compõem o sistema de justiça e de segurança pública.
O Curso de Especialização em Justiça Criminal e Segurança Pública tem sido ministrado na UFF desde 2000, referência na área, a especialização se tornou parte obrigatória para a conclusão do curso superior de polícia para oficiais da PM, tendo inspirado diversas iniciativas relativas ao tema segurança pública. Uma delas é esta obra, que inaugura a série “Justiça Criminal e Segurança Pública em uma Perspectiva Comparada”, a ser integrada à “Coleção Antropologia” do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da UFF. O livro, primeira coletânea das monografias dos alunos do curso de especialização, contribui para uma reflexão crítica e comparada sobre as teorias que informam os modelos para a administração institucional de conflitos em diversos contextos nacionais, além de propiciar uma discussão aberta entre o público acadêmico interessado e os operadores do sistema de Justiça Criminal e Segurança Pública do Brasil e do mundo.
Este livro, dividido em dois volumes, constitui o primeiro de uma coleção que reúne a produção de uma rede de pesquisadores que vêm se dedicando ao estudo dos processos de administração institucional de conflitos em perspectiva comparada. Os textos reunidos demonstram a relevância social e sociológica da pesquisa empírica e da discussão teórica de temas que costumam povoar as páginas de jornal e as conversas cotidianas - como o fazer policial, sua legitimidade, o funcionamento das diversas instâncias do poder judiciário, as técnicas de negociação e administração de conflitos menores, os limites do legal e do ilegal, do moral e do imoral, entre outros.
O site do InEAC reproduz aqui o artigo "O que jovens e policiais da periferia de Brasília têm a dizer? Uma análise sociológica sobre identidades, representações e violências." da antropóloga Haydée Caruso, professora na Universidade de Brasília. Investigadora visitante do ICS-UL e pesquisadora vinculada ao INCT InEAC . O artigo saiu publicado no blog Life Research group da Universidade de Lisboa. https://liferesearchgroup.wordpress.com/2018/01/11/o-que-jovens-e-polici...
"O que jovens e policiais da periferia de Brasília têm a dizer? Uma análise sociológica sobre identidades, representações e violências."
É possível observar uma cidade, sua vida cotidiana, sua cultura local, seu ritmo e os personagens que por ela vivem e circulam por várias perspectivas, eu diria por múltiplas janelas. Uma das janelas que abri para compreender sociologicamente a dinâmica citadina mostra-me os encontros e desencontros que marcam a relação entre os jovens e policiais. Uso a palavra encontro de modo figurado, no sentido de colocar minha lupa sobre a possibilidade concreta de atuação da polícia junto a um de seus públicos prioritários: os jovens.
Neste caso, minha aposta concentra-se na ideia de que o contato, por vezes marcado por colisões entre a polícia e seus públicos, num determinado contexto empírico, pode ser revelador sobre as bases estruturais da relação entre o Estado e uma dada Sociedade.
A partir do interesse em problematizar o lugar da Polícia em sociedades desiguais e com uma frágil democracia, como a brasileira, é que passei a me ocupar em realizar pesquisas empíricas que pudessem colocar luz sobre os dilemas e desafios enfrentados pela Polícia, enquanto uma das instituições estatais de controle social, “mais vistas e pouco conhecidas”, apesar de ser “um fato inevitável da vida moderna”. (Reiner, 2004, p.83).
Portanto, parto da ideia de que uma cidade pode ser decifrada também por aquilo que ela revela cotidianamente, a partir das abordagens que a polícia faz em determinados grupos e não em outros, da sua presença num bairro, numa praça, quadra, escola… enfim, pelas experimentações e vivências que cidadãos e policiais estão imersos e que resulta num exercício de autoridade e alteridade permanente.
Dito isso, resolvi realizar, entre 2013 e 2016, pesquisa empírica na cidade de Ceilândia, localizada há 30km da capital do Brasil e que possui mais de 400 mil habitantes.
Essa não é uma cidade qualquer no contexto da periferia de Brasília. Seu nome traz a marca de sua distinção e vale aqui, em breves palavras, contar que o prefixo CEI remete a Campanha de Erradicação de Invasões, promovida pelo governo nos anos de 1970, no intuito de retirar da nova capital e ícone de cidade modernista, os que vieram de toda parte do Brasil para construí-la, mas que não “cabiam” neste projeto de modernidade. Aqueles que se tornaram indesejáveis invasores e que permaneceram em canteiros de obras transformados em moradias irregulares foram “convencidos” a ganhar um lote nesta nova cidade. (Andrade, 2007; Ribeiro, 2008; Tavares, 2009; Paviani; 2010; Barbosa, 2016)
Passados mais de quarenta anos desde sua criação, Ceilândia é, ao mesmo tempo, ausência e resistência. Território marcado simbolicamente pela ausência (ou insuficiência) de políticas públicas, pelo descaso, abandono, precariedade e perigo traduzido em algumas áreas e em alguns corpos. É simultaneamente palco de enorme resistência, por meio da força de sua cena cultural, especialmente com o Hip Hop; da atuação de coletivos juvenis, de mulheres e de tantos outros atores sociais que se orgulham de serem Ceilandenses e que, por isso, de lá não desejam sair.
Durante o trabalho de campo, foi possível refletir sobre as visões de mundo dos agentes policiais que lá atuam acerca de suas práticas profissionais e as representações em torno de suas ações voltadas para os jovens, bem como entender o que pensam esses mesmos jovens sobre a polícia. Minha proposta consistiu em mapear quem são e o que pensam, levando em conta os elementos sociais, econômicos, culturais e étnico-raciais que norteiam essa relação. Como num jogo de espelhos, a análise das narrativas dos distintos interlocutores visou explorar como os jovens veem a polícia, como essa os enxerga e classifica, e como se veem mutuamente.
Entre as várias dimensões exploradas, uma chamou atenção pelo fato de que os policiais e jovens, quase sempre, estavam no mesmo momento etário, todavia essa condição de ser um jovem policial pareceu trazer uma incompatibilidade em si. Explico o porquê. É como se, uma vez policial, mesmo que ainda jovem, fosse condição suficiente para impossibilitar qualquer possível vinculação identitária com outros jovens a serem policiados, protegidos e/ou controlados.
A farda – como uma segunda pele para o policial – o separa simbolicamente das possíveis brechas de reconhecimento junto ao seu público, o que reforça diuturnamente a ideia de um nós-policiais contra ou em combate a esses outros-inimigos.
Para reforçar esse argumento, foi interessante notar que além de idades semelhantes, muitos jovens e policiais possuíam origens étnicas e geográficas parecidas e, por vezes, compartilhavam de uma mesma estética visual, gostos musicais e estilos de vida; entretanto essas possíveis semelhanças não têm sido suficientes para construir interações que resulte no exercício da autoridade e não da arbitrariedade; que privilegie a garantia de direitos e não a sua exclusão.
Tampouco entre os próprios jovens, as dinâmicas interativas deixam de ser marcadas por múltiplas violências. Ceilândia aparece nos dados oficiais como a cidade com o maior número absoluto de homicídios do Distrito Federal, especialmente entre jovens, do sexo masculino e negros, mesmo que esses números estejam em queda desde 2012. Neste caso, os jovens estão entre as principais vítimas e os principais autores. E se for um jovem negro, a probabilidade de ser uma vítima fatal é 3,37 vezes maior do que um jovem branco, considerando os dados de todo o Distrito Federal (Fonte: IVJ- Violência e Desigualdade Racial 2017).
Portanto, enfrentar tal realidade, seja no contexto local investigado, como em nível nacional, tem sido pauta constante das manifestações públicas de diversos grupos sociais, instituições civis, universidades e, sobretudo, movimentos negros e de jovens no sentido de chamar atenção para a escalada de mortes que insistem em ser invisibilizadas na agenda de intervenção estatal[1].
Aproveito ainda para contar um pouco mais sobre as estratégias adotadas para o trabalho de campo em si, o qual foi fruto de um processo coletivo de construção e imersão no terreno, reunindo pesquisadores de graduação e pós-graduação que, junto comigo ou individualmente, coletaram e analisaram os dados qualitativos obtidos.
Foram várias as técnicas de pesquisa adotadas, desde entrevistas, grupos focais e observação participante em escolas públicas e unidades policiais. Contudo, uma delas foi a mais desafiadora: a que denominei “rodas de conversa”, onde policiais e jovens de diferentes partes do Distrito Federal foram convidados a conversar.
Uma das rodas foi registrada e resultou no documentário Jovens e Policiais: um diálogo possível? Em poucas palavras, a experiência olho no olho propiciou um diálogo incomum, ou melhor, criou um espaço de fala e escuta entre atores reiteradamente colocados em campos opostos em que um representa o Estado, ainda construído, em oposição aos cidadãos.
A possibilidade de uma conversa desprovida de um roteiro pré-determinado de questões e respostas oficiais, em que jovens e policiais expuseram suas visões sobre a vida, suas fragilidades, anseios e medos revelou tanto pelo que foi dito, como também pelo que não foi dito – mas esteve presente nas entrelinhas e nos olhares entrecruzados: as várias feridas que continuam abertas numa sociedade marcada pelo seu passado colonial e escravocrata, que insiste em manter alguns mais iguais que outros, demonstrando que a ideia de uma sociedade livre e plural, ainda, faz parte de um longo percurso a cumprir.
[1] Vale conferir a Campanha “Jovem Negro Vivo” da Anistia Internacional – Brasil. Ver em https://anistia.org.br/campanhas/jovemnegrovivo/ e a ação do Governo Federal Plano Juventude Viva em http://www.juventude.gov.br/juventudeviva/o-plano
Como citar este artigo: Caruso, Haudée (2018) O que jovens e policiais da periferia de Brasília têm a dizer? Uma análise sociológica sobre identidades, representações e violências. Life Research Group Blog, ICS-Lisboa, https://liferesearchgroup.wordpress.com/2018/01/11 11 de janeiro 2018 (Acedido a xx/xx/xx)
A mestranda Emilia Klein Malacarne defende, no próximo dia 17 de janeiro de 2018, a sua dissertação de mestrado "A justiça (Penal) juvenil entre a teoria e a prática: Um estudo comparado entre as práticas judiciais carioca e gaúcha". O orientador da tese é o sociólogo Dr Rodrigo Ghiringhelli, pequisador vinculado ao INCT/InEAC; também estarão na comissão organizadora o professor Dr Ricardo Jacobsen Gloekner (PPGCRIM) e a profa Dra Ana Paula Motta Costa (UFGRS). A defesa acontece às 14h, na sala 1035, da Escola de Dreito da PUCRS.
O artigo discute as práticas dos profissionais responsáveis por classificar uma morte como “homicídio”, suicídio”, “acidente” ou “morte natural” à luz de abordagens construtivistas que tratam dos processos de criminalização. São analisadas as receitas profissionais utilizadas pelo staff da perícia criminal na tipificação de ocorrências. A pesquisa foi realizada em 2012 com base na observação de 19 “perícias de local do crime” no Rio de Janeiro. Os resultados indicam que as práticas adotadas em casos de morte típicos são diferentes das receitas profissionais seguidas pelo mesmo staff nos casos de morte atípicos. Por isso, o trabalho da perícia parece pouco contribuir para a elucidação da autoria em casos típicos de mortes classificadas como homicídios. Os resultados demonstram a desigualdade social na investigação dos homicídios.
Palavras-chave: perícia criminal, investigação criminal, homicídio, processo de criminalização, Rio de Janeiro
Introdução1
Recebido em: 30/09/2016 Aprovado em: 29/11/2017
The paper Homicide, Suicide, Accidental Death... `What Happened?` discusses state agent’s death classification practices as “homicide”, “suicide”, “accident” or “natural death” in the light of constructionist perspective that deals with criminalization processes. It analyzes officers and coroners’ practical action and practical reasoning and their typifications of the offense and the offender to account for what happened. Ethnographic research was developed based on the observation of nineteen "crime scene investigations" carried out by professionals from the Homicide Division of Rio de Janeiro. The results indicate that the reasoning and practices adopted in typical cases of death are different from the practical recipes followed by the staff in atypical cases of death. For this and others reasons theirs works does little to elucidate authorship in typical and more recurrent cases of deaths classified as homicides in Rio de Janeiro. The results demonstrate the social inequality in the homicide investigation. Keywords: criminal forensics, criminal investigation, homicide, process of criminalization, Rio de Janeiro
O sociólogo Michel Lobo, pesquisador vinculado ao INCT-InEAC, está lançando nessa segunda , dia 18 de dezembro de 2017, o livro PRÓXIMO DA JUSTIÇA, DISTANTE DO DIREITO, que sai pela editora Autografia . O lançamento ocorre , às 18h, no Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro , na rua da Matriz, 82, em Botafogo - Rio de Janeiro - RJ.
O site do Ineac disponibiliza aqui o artigo publicado na Revista Brasileira de Sociologia sobre a pesquisa de doutorado, que completou 10 anos, da socióloga Jacqueline Sinhoretto, pesquisadora vinculada ao INCT/InEAC .
Reformar a justiça pelas margens:
um estudo da gestão estatal de conflitos
Jacqueline Sinhoretto*1
RESUMO
O artigo analisa a emergência e o desenvolvimento de um projeto de reforma da justiça que apareceu no final dos anos 1980, no estado de São Paulo, com a intenção de democratizar a justiça: os Centros de Integração da Cidadania (CIC). Mediante o recorte empírico, o estudo aborda a gestão estatal dos con- flitos em diferentes instituições, que mobilizam formas e saberes teóricos e práticos diversos, na oferta de serviços de justiça nos bairros de periferia da metrópole. A metodologia baseou-se em observação direta de atendimentos e audiências nos serviços policiais e judiciais do CIC e em entrevistas realiza- das com agentes estatais e os idealizadores do projeto. O conceito de campo estatal de administração de conflitos é mobilizado para discutir os resultados de pesquisa. Destaca-se o predomínio da lógica da circulação da riqueza em detrimento da gestão da violência na administração dos conflitos; destaca-se ainda que a utilização de serviços custeados pelo Estado não garante a admi- nistração de conflitos pelo direito estatal.
Palavras-chave: Administração de conflitos; Reforma da justiça; Justiças al- ternativas.
* Doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo (2007). Professora do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFSCar. Coordenadora do Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos – GEVAC; pesquisadora do INCT-InEAC. A pesquisa foi apoiada por bolsa CAPES.

ABSTRACT
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REFORMING JUSTICE FROM THE MARGINS: A STUDY ON THE STATE CON- FLICT MANAGEMENT
The article analyzes the emergence and development of a justice reform project ela- borated in the late 1980s, in the state of São Paulo, which aimed democratizing the access to justice: the Centers for the Integration of Citizenship (CIC). Choosing to study this project as an empirical basis, the article analyzes the state management of conflicts in different institutions, which mobilize diverse forms and knowledge to offer justice services in the suburban neighborhoods of the metropolis. The me- thodology was based on direct observation of hearings in the CIC police and judicial services and on interviews with state agents and project creators. The concept of the state field of conflict management is mobilized to discuss the research results. It is described the operation of a logic of conflict management in which the circulation of wealth has a predominance over the management of violence; it was observed that the use of services funded by the State does not guarantee the administration of conflicts by state law.
Keywords: conflict management; justice reform; alternative justice
Passados quase quarenta anos do início da democratização política e so- cial, o tema da democratização da justiça no Brasil ainda está em debate. Nos anos de transição e movimentação social por mudanças, várias propostas de reforma foram colocadas em pauta, algumas experiências foram iniciadas, a justiça foi agitada por mudanças quantitativas. Ainda cabe perguntar, po- rém, como a justiça estatal brasileira dá conta de administrar uma conflitua- lidade social diversa, intensa e que ainda aponta para déficits de igualdade e de direitos.
Um dos modos de formular essa pergunta é analisar a emergência e o desenvolvimento de um projeto de reforma da justiça que apareceu no final dos anos 1980, em São Paulo, com a vocação de ser grande e de produzir impactos significativos em termos de democratizar as instituições da justiça. Com mais de duas décadas de história, os Centros de Integração da Cida- dania – um projeto do governo paulista – constituem um objeto empírico para o estudo do complexo campo da gestão estatal dos conflitos, composto por diferentes instituições, formas diversas de administração de conflitos, diversidade de saberes teóricos e práticos. É também uma oportunidade de verificar, a partir de um ponto de observação, o alcance e os resultados das
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propostas de reforma da justiça e o modo como os serviços são oferecidos nas margens, nos bairros de periferia da grande metrópole.
A presente análise é resultado de um acúmulo de experiências de pes- quisa sobre os Centros de Integração da Cidadania que começou em 1999 e desenvolveu-se junto a várias instituições e na interlocução com diferentes redes de pesquisadores. Iniciou-se no Instituto Brasileiro de Ciências Cri- minais (HADDAD; SINHORETTO; PIETROCOLLA, 2003), prosseguindo na mesma instituição, com novos enfoques e novo grupo, com financiamento do Ministério da Justiça (HADDAD et al, 2006. Teve o desenvolvimento da abordagem teórica na tese de doutorado defendida em 2007 por Sinhoreto (2011) e vem ganhando refinamento interpretativo no debate sediado no Ins- tituto de Estudos Comparados em Administração Institucional de Conflitos – INCT-InEAC, servindo de base empírica para a construção do conceito de campo estatal de administração de conflitos (SINHORETTO, 2010), que será mobilizado para discutir os resultados de pesquisa.
Os Centros de Integração da Cidadania foram criados a partir de 1996, sob coordenação da Secretaria de Justiça e Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo, para aprimorar a oferta de serviços de justiça em bairros de periferia da capital, tendo sido posteriormente implantados em alguns mu- nicípios da região metropolitana e do interior. Existem dezesseis centros em funcionamento, dos quais seis foram sistematicamente visitados pela pes- quisa, mas nem todos oferecem os serviços de justiça. Ao longo dos anos, o foco do programa foi migrando para formas alternativas de administração de conflitos, oferta descentralizada de serviços de documentação, apoio à oferta de serviços municipais ligados a direitos1. Em seu projeto inicial, ele previa os serviços do Juizado Informal (posteriormente instalados Juizados Espe- ciais Cíveis), atendimento do Ministério Público, atendimento da Polícia Civil, assistência jurídica e serviços de mediação, todos os serviços visando realizar administração alternativa de conflitos. Atualmente, os serviços de documentação e educação em direitos prevalecem sobre os serviços de jus- tiça e mediação.
1 As razões do descolamento nos objetivos e resultados do programa são analisadas e discutidas de modo mais detido em Sinhoretto (2011). Elas estão, em alguma medida, relacionadas a uma micro-história do projeto e dos atores diretamente relacionados a ele, bem como estão fortemente relacionadas às permanências estruturais no modo de organização e funcionamento dos serviços de justiça no país. Atualmente a página do CIC na internet sequer menciona o acesso à justiça como um dos objetivos do programa.
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O acompanhamento das mudanças do programa permite compreender as dinâmicas e dificuldades de expansão de oferta das formas clássicas da justi- ça2, apontando para mudanças nas estratégias da gestão estatal dos conflitos. E, desta forma, enseja novas questões para o debate sobre qual justiça é dese- jável e necessária a uma sociedade em vias de consolidar a sua democracia3 e expandir direitos a grupos anteriormente excluídos.
1. Transição política e a ‘justiça injusta’
Ao cabo de vinte anos de ditadura militar (1964-1985), o comprometi- mento das instituições jurídicas com o regime autoritário de governo ha- via se tornado evidente. A crítica da conivência vinha de fora dos quadros jurídicos, mas encontrava ressonância junto a profissionais descontentes e incomodados com a reprodução acrítica de decisões autoritárias.
A questão dos presos políticos e das violações aos direitos humanos no cárcere colocava em cheque a imparcialidade do Judiciário face ao Executi- vo. As forças repressivas organizadas em função do combate aos crimes de caráter político foram deslocando sua atuação violenta para a repressão da criminalidade comum de caráter patrimonial, o que contribuiu para a expan- são da violência estatal, quando as lideranças democráticas supunham a sua retração. Movimentos próprios da economia ilegal, alterações nas formas de organização do mundo do crime, o adensamento populacional nas metró- poles e seu peculiar modo de ocupação, a universalização do consumo, a desorganização institucional das polícias, entre outros fatores, contribuíram para o aumento dos crimes patrimoniais nas grandes cidades. A percepção do medo do crime, no contexto de uma transição política conflituosa, organi- zou os discursos no sentido de relacionar, de um lado, a ditadura e a violên- cia policial à ordem e, de outro, as reformas democratizantes à expansão do
2 Entende-se que formas clássicas de justiça sejam as modalidades de acesso de longa história, como a via do processo judicial, orientada pelos códigos e organizada em varas e tribunais. As vias de acesso mais recentes, inovadoras, são comumente nomeadas de formas alternativas de acesso à justiça, que podem compreender desde procedimentos judiciais informalizados, simplificados, até formas extrajudiciais ou não estatais de administração de conflitos, introduzidas no direito brasileiro por reformas recentes.
3 É temerário escrever sobre a consolidação da democracia no momento de publicação deste artigo, posterior ao impeachment da Presidenta Dilma Rousseff e todos os desdobramentos de uma crise política, concomitante à destituição pelo congresso de um rol significativo de direitos sociais, e de direitos individuais por práticas judiciais.
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crime e à perda da autoridade estatal (CALDEIRA, 2000). Os discursos sobre o crescimento do crime tornaram-se politizados.
Nesse cenário, a atividade profissional dos membros da justiça criminal tornou-se tensionada: de um lado, demandas por maior controle da violên- cia do crime, de outro, demandas por democratização e reformas. Típico da trajetória brasileira de transição é que estas demandas ficaram socialmente inscritas como contraditórias e antagônicas, dividindo em campos políticos opostos os defensores do controle do crime a qualquer preço e os defensores da democracia, das reformas e dos direitos humanos, como se estes fossem entusiastas da desordem.
Internamente ao campo jurídico, isto favoreceu a reunião de um grupo de penalistas de São Paulo organizados, no início dos anos 80, em torno das teses inovadoras defendidas junto à Quinta Câmara do Tribunal de Alçada Criminal. Suas palavras de ordem eram garantias individuais, ativismo dos juízes e defesa dos princípios fundamentais da Constituição. Eram contrá- rios à aplicação acrítica da legislação penal por acreditarem que ela se co- locava a serviço do controle repressivo das classes pobres. “Quanto melhor juiz eu for, mais injusto eu vou ser” era a percepção que tinham os juízes do grupo diante da aplicação literal da lei penal, a qual – sempre se lembravam – tinha sido elaborada no período de uma ditadura, nos anos 1940, e estava sendo aplicada no contexto de outra ditadura.
Essa câmara passou a colocar uma questão que até então não era ob- jeto de consideração, isto é, de que o juiz não está preso ao direito po- sitivo, mas está preso à Constituição. Portanto, pela primeira vez, uma câmara de um tribunal passava a decidir em função do que dizia a Constituição. (Alberto Silva Franco, desembargador aposentado, em entrevista)
A crítica à técnica jurídica elaborada pelos penalistas paulistas4, reconhe- cidos como garantistas, fazia parte de um contexto mais amplo do pensa-
4 A análise das relações no interior desta rede profissional e informações mais robustas sobre o perfil social e institucional dos membros ligados ao “grupo da Quinta Câmara” podem ser encontradas em Sinhoretto (2011). Tratava-se de profissionais bem situados nas hierarquias das profissões jurídicas, porém de perfil ideológico contrário às teses majoritárias do direito penal da época. Atualmente, vários dos expoentes do grupo e seus seguidores ocupam cargos importantes nas cúpulas de tribunais, porém continuam a serem vistos e a se verem como “críticos” e de perfil doutrinário dissidente.
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mento nacional dos anos 80, em que emergia um discurso crítico à dogmáti- ca positivista do direito que denunciava a parcialidade política da técnica, a qual estaria servindo como instrumento de desmobilização das lutas sociais por direitos coletivos – próprias do movimento social daquele período – na medida em que o direito e o Judiciário tratavam todos os conflitos como li- tígios individuais. Não era possível ajuizar causas coletivas e não havia pro- teção legal aos direitos coletivos e difusos. Na formulação dos críticos, dos quais Joaquim Falcão (1981) foi um expoente, a matriz liberal conservadora do direito nacional era um entrave aos processos de democratização social que agitavam a vida política naquele momento, por favorecer a identificação classista do direito e de seus agentes ao status quo, enquanto novas reivindi- cações de direitos e novas práticas de cidadania brotavam dos movimentos populares nas periferias das grandes cidades. A pauta dos juristas para a de- mocratização passou a ser a instituição de direitos coletivos e difusos, com a criação de legislações substantivas e processuais inovadoras e, por fim, da própria Constituição.
As teses sobre a identificação classista do Judiciário foram reforçadas pela atuação, ainda nos anos 80, de juristas-sociólogos que passaram a documentar as barreiras de acesso da população à justiça, seja pela impossibilidade de demandar causas coletivas, seja pela dificuldade em levar adiante a litigação em causas individuais (JUNQUEIRA, 1996). Aparecia uma geração de pes- quisadores que valorizava a coleta de dados empíricos, empenhada em re- gistrar as barreiras econômicas de acesso, mas, sobretudo, as barreiras sim- bólicas representadas pelo distanciamento de classe, pela ininteligibilidade mútua de discursos e categorias entre os protagonistas dos conflitos e os operadores da justiça oficial. O estudo de Boaventura de Sousa Santos sobre o direito de Pasárgada foi um marco para essa geração (SANTOS, 1988).
Enquanto os defensores de políticas repressivas de segurança e justiça enfatizavam a violência do crime, especialmente o patrimonial (CALDEIRA, 2000), entre sociólogos e juristas emergia um pensamento crítico que enfa- tizava a violência simbólica das categorias e formas jurídicas baseadas no direito liberal, na proteção jurídica à propriedade privada, no formalismo processual. Segundo estes, em razão do distanciamento simbólico do Judici- ário em relação à vivência popular, a reforma dos códigos e das instituições judiciais era uma condição da democracia numa sociedade em que a grande maioria dos conflitos, sobretudo aqueles protagonizados pelas classes po-
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pulares, estava sendo administrada ao largo das instâncias formais5. Outra corrente entre os cientistas sociais, representada por Paulo Sérgio Pinheiro (1991), começava a investigar a violência física das instituições estatais e a denunciar as arbitrariedades cometidas no combate ao crime e no interior do cárcere, preferencialmente praticadas contra as mesmas classes populares.
Este debate intelectual se desenvolvia em correspondência com um pro- cesso rápido de mudança social, consonante ao adensamento demográfico intenso e não planejado das periferias das grandes cidades. No caso da me- trópole paulista, a ocupação rápida, intensa e desordenada foi, de um lado, marcada por inúmeros conflitos e, de outro, pela emergência de movimentos de luta por melhorias das condições de vida e expansão dos serviços públi- cos às novas áreas urbanas. Assim, a transição política dos anos 80 também foi marcada pelas disputas em torno da expansão dos serviços à periferia, incluindo o policiamento, a segurança e a justiça.
No contexto desses debates intelectuais e dessas pautas populares, os ex- -componentes da Quinta Câmara foram se desligando da vida institucional da magistratura e passaram a investir sua atuação contestadora em outras frentes. Ao final da década da transição política, eles reuniram-se com anti- gos e novos parceiros para pensar um projeto de segurança e justiça para o plano de governo do candidato Mario Covas (PSDB-SP). Estavam afinados ao diagnóstico da injustiça da atuação da justiça e tinham clareza de que as urgências estavam nos bairros de periferia: assim como a democratização política se oxigenava pelos movimentos sociais que vinham da periferia, a democratização e a oxigenação do Judiciário e da polícia também passariam, na aposta dos formuladores do plano de governo, pela transformação na re- lação com a periferia6.
Resumidamente, o projeto de criação dos Centros de Integração da Cida- dania foi redigido em 1990, pelo grupo de notáveis de discurso dissonante, para ser a espinha dorsal de uma grande reforma das instituições de justiça e segurança paulistas. O projeto propunha a criação de 20 centros em bairros
5 Os resultados trazidos pela PNAD de 1988 foram muito importantes para reforçar o diagnóstico e chamar para a ação: 55% dos entrevistados declararam ter resolvido seus conflitos sem procurar a justiça (IBGE, 1990). Além disso, os temas da violência policial e das execuções sumárias eram muito discutidos naquele momento por vários grupos de intelectuais nas ciências sociais e no direito.
6 Para a análise das ligações do grupo e seus membros com o partido político e o modo como participaram da campanha e da formulação do projeto, consultar Sinhoretto (2011).
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de periferia, onde seriam atendidos prontamente todos os casos criminais, de forma integrada, com a articulação dos serviços das polícias Civil e Mili- tar, Ministério Público, Judiciário e assistência judiciária (a Defensoria Pú- blica só foi criada 16 anos após a elaboração deste projeto). Todos os serviços ficariam localizados no mesmo edifício e passariam a trabalhar de forma integrada, gerando ao mesmo tempo celeridade para vítimas e réus de crimes e aumento do controle mútuo dos agentes estatais, reduzindo as oportunida- des de corrupção e arbitrariedades. A localização nos bairros iria favorecer a proximidade e a identificação entre os cidadãos ali residentes e os agentes estatais, o que também deveria produzir o duplo efeito de aumentar o con- trole popular sobre as instituições e seus agentes e de reduzir as distâncias simbólicas e identificações classistas entre os “operadores da justiça” e o “homem comum”. Tratava-se de uma proposta ousada para o momento, que reivindicava uma “inversão dos termos do acesso à justiça”: “É a Justiça que tem que estar onde está o homem comum.”
Nas entrevistas coletadas para a pesquisa junto aos idealizadores do pro- jeto, sempre foi afirmada a utopia que os movia: a reforma da justiça era vista como uma condição para a democratização da sociedade, porém a reforma dependia de uma transformação na mentalidade dos operadores da justi- ça (juízes, promotores, defensores, policiais) que precisavam romper com o distanciamento simbólico em relação às demandas populares, aos modos de vida da periferia, aos valores e conflitos típicos das comunidades pobres e precárias; precisavam também romper com a identificação de classe elitista que orientava sua conduta e suas decisões para que os operadores pudessem se aproximar da “realidade do homem comum”. Viam a criação do CIC na periferia como uma oportunidade de impulsionar um processo dialético de transformação tanto dos agentes estatais quanto dos cidadãos, que ao utilizar os serviços aprenderiam mais sobre os direitos e os modos de reivindicá-los.
Era forte a aposta do grupo de idealizadores que concebeu os CIC em seu duplo papel ético-pedagógico. Apostava numa mudança de prioridades e princípios para o interior das instituições jurídicas, buscando mudar o seu foco e sua relação com a população mais pobre da periferia e visando pro- duzir um deslocamento da estratégia exclusivamente criminalizadora, que marcava a sua atuação naqueles territórios, para o reconhecimento dos di- reitos daqueles cidadãos. Apostava também que a proximidade e o uso dos serviços de justiça iriam transmitir conhecimentos sobre direitos aos novos
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usuários, que passariam então a sofisticar suas demandas e a usar o direito como uma linguagem do cotidiano. “Acreditávamos naquilo do Vinícius, do operário em construção”, relatou Ranulfo de Melo Freire, desembargador e professor aposentado, em entrevista.
2. A inovação da justiça informal na periferia
O candidato Covas não venceu as eleições em 1990. Elegeu-se governa- dor em 1994, tendo o projeto de criação dos CIC como parte do programa de governo para a justiça, mas sem a centralidade que havia tido anteriormente. O projeto foi implementado a partir de 1996, marcado pela incorporação de uma nova forma de crítica ao funcionamento da justiça, ao formalismo jurídico e ao distanciamento simbólico. Desenvolvido por um advogado com experiência na defesa internacional de direitos humanos, sem vínculos de carreira com as instituições judiciais, o projeto da primeira unidade do CIC, inaugurada na Zona Leste da capital paulista, estava estruturado em torno da crítica ao processo judicial, este visto como forma privilegiada de produção do distanciamento simbólico entre os operadores da justiça e os cidadãos protagonistas dos conflitos. O CIC continuou a ser pensado como projeto para a reforma da justiça, não mais por meio da intervenção clássica dos operadores, mas agora como lugar de desenvolvimento das formas al- ternativas de administração de conflitos. Através de técnicas de mediação, conciliação e por meio de uma atuação “desformalizada”, os conflitos da população local seriam tratados a partir de uma lógica que daria protagonis- mo às partes, recusaria o tratamento criminalizador e incorporaria visões de mundo e concepções de justiça localmente compartilhadas.
De início o CIC era pensado como a justiça devendo ser levada para a periferia. A justiça, né, porque os desembargadores ali, os nossos maio- rais ali, eles tinham a preocupação da justiça – era a visão que eles tinham, né? Nós pudemos captar ou intuir imediatamente que não era o Estado-justiça só que precisava ir para a periferia. Era o Estado, o Es- tado como um todo precisava ir para a periferia. (Belisário dos Santos Jr., ex- Secretário da Justiça, em entrevista)
A preocupação com as formas alternativas de administração de confli- tos, vistas como mais democráticas e emancipadoras, era identificada com a
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imagem de “abolir as paredes” criadas pela técnica jurídica que produziriam segmentação das demandas e individualização dos conflitos. Havia uma preocupação em borrar as fronteiras entre as instituições oficiais e borrar as diferenças entre o Estado (este considerado velho tutelador das deman- das populares) e os cidadãos, protagonistas de sua emancipação pela via da conquista de direitos. Tratava-se, assim, de informalizar procedimentos e adotar uma atuação inovadora no atendimento das demandas por justiça na periferia.
A gente tem a concepção do direito de que você dizendo o direito da for- ma que está escrita nos livros, aquilo faz com que a comunidade rece- ba... Não tem verdade nisso. A gente produz o direito de uma forma que só conforta os operadores do direito, né? A comunidade às vezes fica acordada depois que os juízes, os promotores e os advogados vão dor- mir. (Belisário dos Santos Jr., ex- Secretário da Justiça, em entrevista)
O processo de implantação do primeiro CIC foi lento e negociado com lideranças populares locais, e os servidores alocados foram escolhidos a dedo entre simpatizantes da inovação. A proposta era integrar os serviços do Judiciário (por meio do Juizado Informal de Conciliação), do Ministério Público (pelo atendimento ao público), da Polícia Civil (mediante uma dele- gacia especial para a conciliação de conflitos), da Assistência Social (por um programa de mediação de conflitos familiares), serviços de documentação e atendimento aos mutuários dos conjuntos habitacionais. Um conselho de lideranças políticas locais representava a comunidade, sendo um espaço de expressão de demandas coletivas e de comunicação com as expectativas da população atendida.
De 1996 a 2001, foram inauguradas quatro unidades do Centro de In- tegração da Cidadania. As avaliações do programa indicavam sucesso em construir uma via alternativa de administração de conflitos, que estaria ten- do impacto transformador sobre a “mentalidade” dos operadores jurídicos e impacto sobre a redução das taxas de violência nos bairros atendidos. Por causa dessa propaganda, a implantação dos CIC foi incluída como uma das políticas de prevenção da violência a ser financiada pelo Ministério da Jus- tiça. Atualmente há 16 centros em funcionamento em São Paulo, mas as unidades mais recentes não contam com a prestação de serviços formais de justiça, devido à mudança de foco do programa.
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Embora houvesse um grande entusiasmo discursivo em torno dos CIC, o fato é que a sua criação pouco ou nada impactou o modo clássico de fun- cionamento das instituições judiciais. À parte alguns profissionais pessoal- mente orientados para a proposta de reforma, para a maior parte dos juízes, delegados e promotores, a designação para atuar no CIC sempre foi vista como uma tarefa menor, quando não um castigo. A implantação dos postos em bairros distantes da periferia não mudou a política de prestação de servi- ços das instituições parceiras do programa. O CIC, ao invés de ser um pólo propagador de inovações, da periferia em direção ao centro, das bases em direção ao topo – como na aposta dos seus criadores –, foi rapidamente colo- nizado pelas culturas organizacionais das instituições parceiras, tornando- -se um posto de trabalho desprestigiado e pouco relevante para a construção das carreiras profissionais dos seus ocupantes. Mas seguiu, durante alguns anos, sendo um posto de trabalho diferenciado dos demais em função de sua proposta informalizadora. E, por isso, o CIC se tornou uma janela extrema- mente promissora para a observação de um movimento importante para a compreensão dos processos em curso na expansão da oferta de justiça.
De fato, no transcurso dos anos 2000, o cenário da prestação estatal dos serviços de justiça sofreu transformações importantes. Foram criados os Jui- zados Especiais, que modificaram o cenário do acesso à justiça formal. As formas alternativas cresceram em importância, dentro e fora da esfera esta- tal, pela via da conciliação e da mediação (cf. OLIVEIRA, 2010). Passou-se a falar em justiça restaurativa, mesmo que os programas efetivamente im- plementados sejam muito restritos e pouco avaliados (ver SCHUCH, 2008; TONCHE, 2010; AZEVEDO; PALLAMOLLA, 2014).
Um levantamento produzido pelo Ministério da Justiça em 2005 procurou mapear a dimensão dessa expansão das alternativas, constatando a tendên- cia dos tribunais em implementar programas nessa linha e a incidência dos programas que recebem financiamento público: 50% dos programas identi- ficados eram diretamente patrocinados por órgãos judiciários e governamen- tais e, entre os programas governamentais, o principal parceiro financiador era um órgão estatal (MISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2005). A implementação de serviços alternativos de justiça é uma tendência contemporânea.
Outro dado relevante foi trazido pela PNAD 2009 que coletou informa- ções sobre o acesso à justiça. A última comparação era de dados produzidos em 1988, ano em que 45% dos entrevistados envolvidos em conflito haviam
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procurado a justiça para solucioná-los. Em 2009, essa procura aumentou para 58%, acrescida de 12% que responderam ter procurado os juizados especiais. Ainda, porém, entre os 30% que não procuraram a justiça, 27% declararam ter utilizado a mediação ou a conciliação para administrar o con- flito (IBGE, 2010).
O CIC foi uma das iniciativas pioneiras nessa seara. Além de ser o espa- ço de implantação dos únicos Juizados Especiais Cíveis que funcionam em bairros da capital fora das instalações dos foros regionais, também a Polí- cia Civil e o Ministério Público realizam atendimentos em que conciliam conflitos de maneira informal. Em 2012, os CIC sediaram um programa de Câmaras de Mediação, com mediadores voluntários aos moldes da mediação comunitária. Até mesmo atendimentos da Polícia Militar foram orientados pela administração informal de conflitos. A adesão da Defensoria Pública ao programa, nos seus primeiros anos, realizou-se em duplo registro: aumento da oferta de acesso formal à justiça para os usuários do CIC e impulso ao projeto da própria Defensoria de trabalhar com as formas alternativas.
Mas no que consiste essa justiça estatal alternativa? Qual é o sentido e o significado dessas práticas? Como elas se relacionam ao ideal de reforma pautado nos anos 80 e 90? Que tipo de reforma essa expansão da oferta esta- tal de administração de justiça efetivamente produz?
3. A administração dos conflitos no CIC
A análise da administração de conflitos no CIC está embasada num tra- balho de observação dos atendimentos, sessões de conciliação, mediação e audiências, realizado de maneira sistemática entre 2004 e 2005, junto aos serviços da Polícia Civil, do Ministério Público e do Juizado Especial Cível, em três postos da cidade de São Paulo (CIC Leste, Oeste e Sul). Ob- servações da mediação alternativa comunitária, realizadas em 2010 nos CIC Leste e Sul, complementaram e aprofundaram as linhas de análise e interpretação7.
7 Para a descrição das técnicas utilizadas e de todo o conjunto dos dados obtidos e casos registrados, ver Sinhoretto (2011). São quase duas centenas de casos pessoalmente observados e registrados em caderno de campo e cerca de 400 casos observados em conjunto com a equipe de pesquisadores, além de um conjunto robusto de entrevistas realizadas com os idealizadores, as equipes gestoras responsáveis pela implantação do projeto, os servidores públicos que atendiam nos postos do CIC e usuários (HADDAD et al, 2006).
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O estudo da atuação da Polícia Civil no CIC é muito interessante para pensar e discutir as contradições e ambiguidades das propostas de reforma na administração estatal de conflitos. Se, de um lado, não é uma atribuição legal e formal da polícia resolver conflitos, de outro, há uma tradição de longa duração orientada por princípios e práticas bem estruturados de admi- nistração extrajudicial de conflitos pela polícia. Os primeiros estudos sobre polícia já registravam essas práticas, seus modos de estruturação e seus va- lores (OLIVEIRA, 2004; PAIXÃO, 1982; KANT DE LIMA, 1995; MINGARDI, 1992). Os historiadores apontaram para a sua importância e função desde a constituição da instituição (BRETAS, 1996), tendo sido uma das atribuições formais e legais da polícia no Império. Os pesquisadores argumentam que a administração informal de conflitos é e sempre foi uma peça importante na relação entre polícia e os usuários dos seus serviços.
Tendo em conta essa antiga tradição informal, os primeiros policiais de- signados para atuar no CIC na administração de conflitos, mesmo no âmbito de um projeto que se propagava como inovador, não tiveram muitas difi- culdades para atualizar naquele novo espaço a forma tradicional de traba- lho. Porém, também aderiram ao discurso inovador, atribuindo à sua práti- ca as qualidades de “uma polícia de primeiro mundo”, exercida no registro da prevenção de conflitos e não da repressão aos crimes que não puderam ser evitados. A qualidade superior do seu trabalho estaria em antecipar-se à ocorrência de crimes, intervindo e apaziguando as relações antes que elas caminhassem para um desfecho violento. Sempre foi reafirmado pelos poli- ciais que conflitos simples, quando não administrados rapidamente, muitas vezes acabam tendo um desfecho violento. Daí a importância do trabalho preventivo da polícia, realizado de modo criativo, com o emprego do bom- -senso. Essa é a justificativa moral e socialmente relevante, para realizarem uma atribuição que não lhes compete legalmente e não pode ser computada institucionalmente nos registros da produção policial.
Quem observa os atendimentos da polícia preventiva percebe que a gran- de maioria deles versa sobre conflitos de natureza cível, apesar de a polícia formalmente ser parte do aparato penal. A justificativa para que a polícia atue nesses casos é a potencialidade de que os conflitos interpessoais pos- sam evoluir para agressões físicas, ameaças, violações de outras naturezas e até mesmo, em casos extremos, homicídio. A maioria dos conflitos é entre vizinhos, famílias e casais, e comerciantes.
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É de notar que na literatura sobre as funções da polícia na administração dos conflitos é comum encontrar o argumento, compartilhado muitas vezes com usuários e policiais, de que a polícia é procurada para administrar conflitos cíveis em razão de o sistema formal de justiça ser de difícil acesso. Enquanto a delegacia teria as portas abertas 24 horas do dia, os serviços de justiça seriam distantes e de acesso complicado, daí a polícia ser procurada e exercer essa atividade informal como meio de contornar a inacessibilidade dos serviços formais. Porém, não é isso o que ocorre no CIC: ali, ao lado do atendimento da Polícia Civil estão o balcão do cartório do Juizado Especial Cível e o serviço de assistência judiciária. Mesmo assim, em diversos casos, foi perceptível uma preferência dos usuários em ser atendido pela polícia e não por outros serviços. Em outros, ocorreu uma circulação da mesma de- manda por vários serviços, denotando que eles não são bem hierarquizados como propõe a retórica formal da justiça.
A lógica da administração dos conflitos no atendimento policial consiste em mobilizar o aparato penal para intervir em conflitos cíveis. Mas isso só tem eficácia na medida em que os acordos firmados diante do policial não sejam formalizados, exatamente porque não teriam o mesmo desfecho se ti- vessem que ser homologados por um juiz ou registrados publicamente. Essa ambigüidade advinda do trânsito entre duas lógicas – a cível e a penal – é o que caracteriza a administração dos conflitos e destaca a polícia como uma instância diferenciada, com possibilidades que outros serviços não têm. A possibilidade de dar ao conflito cível um tratamento típico da lógica crimi- nal, como mobilizar a ficha de antecedentes criminais de uma das partes ou ameaçar com um registro ou uma acusação criminal formal, é que dá à polícia uma vantagem na produção de acordos entre as partes conflitantes. Veja-se o Caso 1.
Caso 1 - Dois homens em desacordo por uma dívida apresentaram-se ao delegado com roupas muito simples, o devedor de bermuda e chine- lo, os pés muito sujos. Este havia oferecido ao credor uma promissória assinada por outra pessoa, que não foi saldada. Não havia consenso sobre o valor devido, vez que o devedor afirmava já ter pagado parte da dívida; o credor cobrava alguma correção pelo transcurso do tempo. O devedor ofereceu um parcelamento de R$ 100 por mês, o credor achou “difícil”. O delegado informou que o acordo seria transcrito no papel, na frente do juiz. Explicou a um que o dinheiro se desvaloriza com o
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tempo, “um agiota cobraria juros”, explicou ao outro que, para quem ganha pouco, pagar a quantia mensal significa um sacrifício. Diante das resistências silenciosas de ambos, o delegado dirigiu-se ao deve- dor:
— O Ministério Público sabe que você tem o desmanche? — Não, senhor.
— Você compra carro de quem?
— Carro velho e que dá baixa.
— Como é o seu apelido?
O devedor respondeu e o delegado já interpôs mais uma pergunta, com ar de intimidação, sobre a localização do desmanche. Após uma pausa de suspense, declarou conclusivo:
— Você pode pagar R$ 150 por mês.
— Não posso, doutor!
— 120, então. Dez vezes de 120.
O devedor acabou cedendo para encerrar a pressão e evitar que sua situação transitasse de uma dívida para uma ação criminal por causa de alguma irregularidade no desmanche, ramo de atividade associada, no senso comum e no saber policial, ao roubo de carros.
O procedimento para a obtenção do acordo é tipicamente policial por acionar a possibilidade de mobilizar o tratamento criminal do conflito como uma ameaça: ninguém é obrigado a assinar o acordo, mas não fazê-lo pode implicar numa investigação policial e em repressão criminal. A tática con- siste em lançar uma informação, supostamente privilegiada, para colher ou- tra ainda não revelada. É o popular “jogar verde para colher maduro”. O delegado não sabia a localização do desmanche, mas sugeriu conhecer o ramo de atividade e a ilicitude do negócio. Não fez acusação formal, apenas manipulou sentidos implícitos e subentendidos. Essa era uma técnica muito elogiada nos corredores do CIC, onde se dizia que o delegado, para atuar na função preventiva e administrar de modo inteligente os conflitos, tinha que “saber trabalhar” e “endurecer quando é preciso”.
No caso apresentado, a ideia de que o acordo favoreceu as duas partes só pode ser compreendida quando se leva em conta que o devedor já ganhou alguma coisa simplesmente por não ter se envolvido em uma complicação maior. O que significa também que a contrapartida da aceitação do acordo é uma anuência implícita do agente estatal com as práticas da economia infor- mal (que poderia até ser criminal, caso fosse procedente a insinuação de que o desmanche sediava práticas ilegais).
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Do ponto de vista da análise da administração do conflito, uma ques- tão cível, que opunha dois interesses individuais privados, resolveu-se num acordo apenas quando a polaridade de negociação deixou de ser entre indi- víduos e passou a ser entre o indivíduo e o poder punitivo do Estado. A lógi- ca do conflito transitou do direito dos contratos livremente firmados para a do direito penal. Porém, esse direito penal informalmente administrado não contempla as garantias do acusado (que são o centro do direito moderno) exatamente por não haver acusação formal.
Dezenas de casos semelhantes poderiam ser aqui reproduzidas e todas elas têm o traço típico dessa expansão informal do direito penal para a ad- ministração de conflitos cíveis. Há um deslizamento do eixo do conflito de uma relação entre indivíduos iguais para uma relação entre o indivíduo e o poder punitivo estatal. Esse poder se fortalece ao se expandir sobre a gestão da economia informal, exercendo de certa forma um controle sobre a parte da economia que está fora do controle de outros órgãos estatais – o que, no cenário das populosas periferias paulistanas, não é desprezível. Porém, esse fortalecimento é ambíguo porque exercido na exata medida em que o agente estatal abre mão de vigiar a legalidade e de investigar as suspeitas de irregu- laridade para que o acordo seja firmado e atenda aos interesses dos indiví- duos. Esses casos demonstram que o fluxo econômico entre os particulares é privilegiado em relação à aplicação das leis, de forma que a intervenção estatal sobre os conflitos econômicos não está orientada para a formalização da economia informal, nem teria poder de fazê-lo nos limites dados.
Muitos comerciantes recorrem à polícia como instância de administração de conflitos por entenderem a lógica do procedimento: solucionar conflitos mediante o peso simbólico do Estado, sem serem obrigados a todas as exi- gências do enquadramento legal das suas atividades. Em geral, nos casos observados, saem bastante satisfeitos com os acordos firmados, mesmo se não atendidos em todas as suas pretensões iniciais.
Outro tipo de caso muito atendido pela polícia no CIC envolve relações conjugais desfeitas e conflitos familiares. Em geral, o recurso à polícia não é a primeira tentativa de administrar o conflito, mas uma renegociação do acordo firmado anteriormente. Diferentemente do que se pudesse esperar de uma instância do aparato penal, o conteúdo central do que é administrado nos procedimentos policiais de mediação familiar comuns no espaço do CIC não é a violência doméstica ou conjugal. Não que narrativas de violência não
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apareçam, elas apenas não são privilegiadas na administração do conflito. São as questões patrimoniais envolvidas que ganham relevo: quem tem a propriedade dos bens, como realizar a sua divisão, suspensão temporária de pagamento de pensões, renegociação de dívidas de pensão acumuladas, definição de papéis e condutas.
Da experiência vivenciada no campo da pesquisa, observou-se que a pos- sibilidade de administrar alternativamente o conflito conjugal em várias ins- tâncias aponta não para a possibilidade de chegar mais rápida e facilmente ao mesmo tipo de acordo, mas para o inverso. As alternativas de justiça são alternativas de fórmulas de ajustamento diversas entre os ex-cônjuges, mobilizados por cada um deles na tentativa de assegurar seus interesses in- dividuais da melhor forma.
No Judiciário e no Ministério Público, o acordo de separação e guarda dos filhos tende a privilegiar uma visão típica e estereotipada dos papéis de gênero que tende a favorecer as mulheres como mães. Em geral, os acordos e sentenças judiciais dão a elas a guarda dos filhos (tanto mais certa quanto menor a idade da criança), o usufruto da residência e a pensão alimentícia. Nem sempre os acordos homologados judicialmente são consensuais porque muitos pais se ressentem de serem privados da livre convivência com seus filhos e de, adicionalmente, terem que pagar a pensão estipulada. A interve- niência do Ministério Público e do Judiciário na negociação das condições dos acordos de separação e guarda é justificada como necessária em razão das desigualdades de gênero que historicamente têm marcado a sociedade brasileira; contudo, ela estabelece a tutela estatal dos indivíduos e de suas vidas privadas e opera o congelamento de papéis de gênero tradicionais. Muitos indivíduos se ressentem dessa tutela e não cumprem as sentenças judiciais. Isto ocorre tanto pela reivindicação de direitos igualitários entre pais e mães, como é o caso dos movimentos pela guarda compartilhada, por novos papéis desempenhados pelos pais e contra a alienação parental8, quanto pela reivindicação de estatutos desiguais, como é o caso mais fre- quentemente observado no serviço policial do CIC.
8 Veja-se o exemplo da “Pai Legal”, associação criada em reação à resistência encontrada por vários de seus membros ao reconhecimento da guarda compartilhada pelo Judiciário. O mesmo objetivo também foi um dos motivadores da criação do Instituto Brasileiro do Direito de Família – IBDFAM, “no intento de promover um Judiciário mais adequado às demandas da contemporaneidade”.
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Como tem sido apontado nos estudos sobre delegacias da mulher (SOA- RES, 2002; SANTOS; IZUMINO, 2005), estas se constituíram como espaços institucionais em que as mulheres são acolhidas quando assumem o papel de vítimas da violência conjugal (mesmo que nem todas sejam efetivamente acolhidas), e a assunção desse papel dá acesso a uma forma específica de ad- ministração do conflito conjugal (sabendo que essa forma muda ao longo do tempo em decorrência das mudanças de legislação), na qual as mulheres são sempre as vítimas da violência. Mas nem todo serviço policial trabalha com a lógica da delegacia especializada. O traço típico do serviço policial do CIC é a desconstrução da violência conjugal como foco do tratamento do conflito e o privilegiamento das questões patrimoniais envolvidas na dissolução do casal. Porém o próprio tratamento dessas questões é orientado por princípios diversos daqueles comumente encontrados nas varas de família, onde a mu- lher-mãe tem facilidade de defender seus interesses. Nos casos observados no CIC, os ex-maridos conseguem questionar e renegociar os acordos judi- ciais que percebem como desfavoráveis. Nos casos mais emblemáticos9, os pais se dirigem ao serviço policial com acusações contra a conduta sexual ou moral de suas ex-esposas. Elas estariam sendo negligentes no cuidado dos filhos, expondo-os a riscos físicos e psicológicos, a partir do momento em que ingressam em um novo relacionamento amoroso. É comum deixar no ar suspeitas de que o novo namorado possa assediar sexualmente as crianças. A reivindicação deles é de interromper a assistência material em razão de haver agora outro provedor na relação (“e eu vou ficar pagando sendo que ela tá botando outro dentro de casa?”), ou então de proibir a entrada de pessoas na casa em que eles continuam sendo os provedores (“enquanto não saírem os papéis, a casa ainda é minha”). A administração típica desse conflito no serviço policial do CIC produz acordos em que as mulheres aceitam abrir mão de contrair uma nova relação amorosa em troca de permanecerem com a guarda dos filhos, o usufruto da casa e a pensão alimentícia.
Depois de observar alguns casos se repetirem com o mesmo desfecho na polícia do CIC e de observar que casos semelhantes quando encaminhados ao Ministério Público do CIC ou às varas de família têm desfechos diferentes, vai se desenhando a compreensão de um campo estatal de administração de conflitos com múltiplas entradas alternativas, cada uma delas operada com
9 Esses casos estão relatados em Sinhoretto (2011) e em Haddad et al (2006).
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lógicas diferentes que produzem arranjos específicos correspondentes a mo- delos diferentes de relação social entre as partes em conflito. O conceito de um campo aciona a idéia de um conflito entre as formas de administração de conflitos existentes, as quais disputam o mesmo espaço social, prestígio, recursos e estão hierarquizadas por uma lógica comum que desiguala sabe- res, práticas, profissões, lugares, situações, pessoas.
No caso do Judiciário ou do Ministério Público, as mulheres têm faci- lidade em defender interesses enquanto assumem o papel privilegiado de mãe e só ficam arriscadas de perder a guarda dos filhos (que implica no usufruto da casa e da pensão) se tiverem sérias dificuldades em cumprir o papel maternal clássico, porque se parte do princípio moral de que o melhor para os filhos é permanecer residindo com a mãe. Tal como ocorre na dele- gacia da mulher, as varas judiciais de família são espaços institucionais que promovem um certo padrão de relação de gênero e de relação conjugal, que estabelece uma tarefa específica para a mulher, da qual decorrem obrigações e benefícios.
Contudo, esse arranjo pode ser questionado nas instâncias informais de administração de conflitos contidas dentro ainda do aparato estatal, como acontece no caso aqui analisado. Na polícia são administrados preferencial- mente conflitos em relações de gênero em que a distância hierárquica entre o homem e a mulher é grande, seja em razão de elas serem totalmente depen- dentes financeiramente, seja pela interveniência de valores culturais sobre a família e o gênero que promovem a desigualdade10. Nessas relações, a guarda dos filhos e os benefícios que dela decorrem só são justificados para as mu- lheres em sacrifício às suas liberdades individuais, em especial à liberdade sexual. Assim, a administração informal de conflitos familiares pela polícia é o espaço privilegiado em que os homens podem veicular o seu discurso de vítimas e conseguir, mesmo que temporariamente, exercer o controle da vida de suas ex-parceiras como uma prerrogativa natural do provedor da casa.
Se, de um lado, se pode afirmar que para cada modelo de relação de gênero há um espaço de administração estatal de conflitos que melhor se adéqua, de outro, isto significa que o campo estatal de administração de con-
10 Em ao menos dois casos observados, a nordestinidade foi invocada pelos homens como um valor cultural a dar sustentação às suas reivindicações de controle da vida amorosa e sexual das mulheres, mesmo após o fim do casamento, na qualidade de um direito cultural à diferença, em frases típicas que iniciam com “Doutor, eu sou nordestino...”.
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flitos é fragmentado e operado por diversas lógicas e sensibilidades jurídicas diferentes. O direito estatal está longe de ser hegemônico na regulação dos conflitos produzida pelos órgãos estatais. Então, se afirmar que a expansão dos serviços informais e alternativos de justiça, mesmo se custeada e promo- vida pelo Estado, não significa a expansão do Estado de direito, entendido como a expansão da regulação dos conflitos pela lógica do direito estatal. Essa diversidade de formas de administração de conflitos pode correspon- der a expectativas e interesses dos indivíduos, contudo retira do horizonte de possibilidades a igualdade de tratamento e, nos casos aqui analisados, a equidade dos indivíduos nas disputas, visto que, tanto nos conflitos econô- micos quanto nos familiares, as partes mais fracas têm sérias dificuldades em defender seus interesses.
Se o interesse de regulação do uso da violência física não é traço marcante da atuação policial no CIC, tampouco ele aparece na atuação do Judiciário. O primeiro posto do CIC foi criado no ano seguinte à edição da Lei 9.099/95, que instituiu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Para dentro da insti- tuição judicial paulista, a proposta de atuação “desformalizada” e inovadora trazida pelos centros de integração foi lida e respondida como uma oportu- nidade de implementar a nova Lei – à qual a instituição foi relutante, sendo uma das últimas no cenário nacional a criar os juizados11. Mas havia uma resistência da parte dos gestores do CIC ao tratamento penal dos conflitos, em razão das críticas à ‘justiça injusta’ anteriormente expostas. Dessa forma, só o juizado cível foi implantado nos postos da periferia.
Assim, a criação dos serviços alternativos de justiça claramente ficou orientada para diversificar e ampliar os canais de tratamento dos conflitos patrimoniais e econômicos individuais. E, mesmo nos conflitos interpesso- ais no âmbito da família, do casal ou da vizinhança, é sempre a dimensão econômica dos conflitos que encontra respaldo. A análise das audiências de conciliação dos juizados (e mesmo das de instrução) revela uma clara tendência em privilegiar a discussão das questões econômicas (quem deve a quem, quanto e qual a forma de pagamento) e negligenciar ou até mesmo bloquear a discussão das questões subjetivas, de reconhecimento e morais que emergem no processo do conflito.
11 Chasin (2007) realizou pesquisa no Juizado Especial Cível do CIC Leste e chegou a conclusões convergentes.
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Cardoso de Oliveira (2002) já chamou a atenção para a importância das questões morais e afetivas na busca pelo direito e nas instâncias estatais de justiça. Muitas causas têm valores muito baixos e muitas vezes os liti- gantes têm dificuldades de expressar suas demandas em termos legais; ou- tras vezes, as demandas não encontram um respaldo no direito vigente, mas ainda assim os indivíduos insistem em levar à frente o litígio. Isto porque, na maior parte das vezes, estão muito mais interessados em se fazer ouvir no espaço público, ser reconhecido como sujeito moral que foi lesado em sua dignidade e insultado, que passou por um sofrimento e uma injustiça e merece uma compensação por isso, do que em administrar propriamente a questão econômica que enuncia o conflito. Isto significa que, sem espaço para a expressão das questões subjetivas e morais, o indivíduo pode até ga- nhar a causa e mesmo assim ainda não se sentir contemplado. Ou, em caso inverso, pode se chegar a um acordo considerado satisfatório, mesmo que não contemple a integralidade da demanda inicial.
A justificativa para a criação do CIC e dos juizados especiais, como já foi apontado, conferia relevância ao papel ético-pedagógico da utilização da justiça para o aprendizado dos direitos e da cidadania por uma população que havia sido historicamente alijada do acesso à justiça. Não é o valor da causa que teria relevância, mas a possibilidade do cidadão sentir-se ouvido, contemplado e resolver os seus conflitos de forma rápida e compreensível.
Contudo, a observação das audiências dos juizados evidencia que essa aposta original não tem muito espaço no modo como o trabalho de conci- liadores e juízes é realizado. Geralmente quando uma das partes começa a enunciar as demandas subjetivas e a explicar seus pontos de vista, o conci- liador, orientado por uma racionalidade burocrática do serviço e pela pres- são da pauta extensa, inibe essas manifestações com o argumento de que a conciliação não é espaço para discutir o mérito da causa, somente a possi- bilidade de um acordo, e centra-se diretamente sobre o valor monetário em questão. Se o acordo não for facilmente obtido, o caso é geralmente encami- nhado ao juiz, que repete basicamente o mesmo procedimento. Frases como “vocês não vão ficar aqui discutindo!”, “agora eu tenho que parar tudo para ficar conversando com vocês?”, “se vocês querem ficar discutindo, eu posso sair da sala e deixar vocês aí” foram ditas por juízes durante as audiências de conciliação com o intuito de pressionar para a obtenção rápida de um acordo e limitar a expressão subjetiva dos indivíduos em conflito. Essas frases indi-
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cam um controle estreito da enunciação das questões e do tempo disponível para fazê-lo. Discutir o conflito não é o comportamento esperado do usuário do juizado pelos conciliadores e juízes. Mas não é só um interdito do proce- dimento, os juízes realmente ficam irritados e reclamam dos usuários que insistem nas motivações morais dos litígios.
Em oposição a isso, o que se espera é o acordo rápido, pois ele encerra o processo e reduz o trabalho acumulado na pauta do juizado. Para isso, con- ciliadores e juízes lançam mão de técnicas e argumentos que têm potencial de convencer as partes a verem o acordo como a única possibilidade pos- sível de administrar o conflito e, por isso, devem ceder em suas posições e demandas. Uma das táticas é dizer às partes que “esta audiência é para fazer acordo”, deixando entender que se o acordo não for formulado o caso se encerra (o que não é verdade, mas tem eficácia diante do desconhecimento dos procedimentos judiciais por grande parte dos usuários do CIC). Outro argumento comum é mobilizar as próprias barreiras de acesso à justiça para fazer o usuário desistir de prosseguir com sua demanda: se não for firmado o acordo, as empresas têm facilidade com advogados, têm recursos e poderão protelar a execução da sentença indefinidamente e o caso nunca terá fim.
Há dois problemas na interveniência da lógica da racionalidade buro- crática do serviço na administração do conflito em face das expectativas reformadoras e democratizantes associadas à criação do juizado. Um deles é que a terceira parte, que deveria representar a neutralidade e equidistância diante dos litigantes, envolve-se e passa a militar ativamente por um desfe- cho específico – o acordo – e isso é muitas vezes interpretado pelos usuários como parcialidade e favorecimento da outra parte. O outro problema, que às vezes decorre do primeiro, é que muitos usuários saem da experiência ainda mais convencidos de que a justiça funciona de formas diferentes para ricos e pobres – ainda mais quando o próprio juiz argumenta que a situação desi- gual de litigação desaconselha a insistir nas pretensões de ganhar a causa.
Predomínio da racionalidade burocrática e silenciamento das questões de ordem moral são traços típicos da atuação dos Juizados Especiais Cíveis. Mas um terceiro traço foi marcante entre os casos observados por esta pes- quisa: a capacidade do ritual informal cível defender-se de administrar as questões relativas ao uso da violência física ou sua ameaça. Apenas as ques- tões patrimoniais são concernentes ao juizado e o controle da fronteira com outras dimensões de conflito (e com outros campos do direito) se dá desde o
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ingresso da demanda, mediante a seleção feita ainda no balcão do cartório, até a vigilância estrita dessas fronteiras durante as audiências. No conjunto de situações observadas, todas as vezes em que uma ameaça de uso da força foi mencionada, seu tratamento foi prontamente rechaçado com a explica- ção de que essas questões são da alçada criminal e que o juizado cível não é o lugar para colocar em evidência este tipo de questão.
A lógica que predomina entre os diversos serviços e atores institucionais investigados durante os anos em campo no CIC atribui máxima relevância ao tratamento das questões patrimoniais individualizadas envolvidas nos conflitos do cotidiano das periferias paulistanas e atribui a irrelevância da administração do uso da violência física, seja naquilo que é realizado pela Polícia Civil, pelo Ministério Público ou pelo Poder Judiciário. A mesma tendência foi verificada junto à câmara de mediação, na qual mediadores “leigos” (isto é, sobre os quais não recai exigência de diploma superior para o exercício da atividade, apenas de uma capacitação rápida) atuam em conflitos interpessoais (familiares, de vizinhança) e econômicos (consumo e serviços). O que há de específico e sensível nesse tratamento é a administração, no interior de órgãos estatais, dos conflitos gestados no interior da economia informal e das relações familiares e de vizinhança não regulamentadas. Ou seja, há por parte dos serviços estatais mais capilares um interesse forte de gestão da economia informal ou da circulação informal de recursos entre os indivíduos e agentes econômicos. Contudo, esse interesse de gestão não se converte em controle formal da circulação econômica, nem parece ser essa a intenção. Trata-se antes de uma gestão estatal diferencial, sutilmente modelada para o alcance mais capilar dos conflitos advindos da circulação informal de recursos econômicos em micro-escala. O Estado é acionado para essa gestão e a ela responde, sem que a aplicação da lei se faça necessaria- mente presente.
Em contraponto, o uso da violência física, nesse nível capilar de expansão dos serviços de justiça, permanece desregulado e desinteressante, atribuído a outras formas de controle. Isto se torna ainda mais interessante à análise quando se contextualiza esse controle estatal informalizado da economia em micro-escala em face do endurecimento do controle estatal formal nos mes- mos territórios de periferia em que a experiência do CIC pode ser observada. Na mesma década em que ocorreu a expansão da justiça informal, as taxas de encarceramento aumentaram significativamente, em especial no que tan-
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ge a delitos ligados à economia criminal, como comércio de drogas, roubos e furtos. Parece claro que se desenham estratégias diferenciais de controle so- cial que apelam tanto para o endurecimento dos mecanismos formais, com destaque para o encarceramento, quanto para formas mais suaves, sutis e ca- pilares de controle12. Ambas as estratégias, endurecimento e informalização, contudo, deixam larga margem para o uso desregulado da violência física, mesmo que este uso não seja indiscriminado, posto que seja objeto de modos de controle formal e informal, estatal e societal13, que levaram a um declínio das taxas de homicídio nas periferias no mesmo período e a uma maior pro- blematização da violência doméstica, com a edição da Lei Maria da Penha.
Considerações finais
O balanço dos efeitos da reforma da justiça proposta, no contexto da tran- sição política para a democracia, entre segmentos do mundo jurídico paulis- ta é ambíguo. De um lado, não se pode dizer que os objetivos iniciais tenham sido alcançados, porque a experiência dos centros de justiça na periferia é absolutamente marginal no interior das instituições que compõem da justiça estatal em São Paulo. Os postos de trabalho no CIC são desprestigiados, não correspondem a uma estratégia sólida de descentralização do atendimento nem a planos mais audaciosos de reforma institucional. O CIC é uma expe- riência francamente minoritária no contexto da justiça paulista. De outro lado, esses postos existem e ganham significado particular na gestão estatal dos conflitos nas localidades em que se implantam. A informalização da justiça é uma tendência contemporânea forte e os serviços de conciliação e mediação não cessam de se expandir – caracterizando claramente uma mudança no modo como os serviços estatais gestionam a conflitualidade. Essa tendência foi reforçada pelas reformas implementadas com a criação dos juizados especiais, por projetos do Executivo em diversas esferas e por determinações do Conselho Nacional de Justiça.
Não se pode concluir que tudo saiu como o planejado pelos reformadores nos anos 80. O que se materializou, nos dez postos do CIC analisados, é o
12 Isto nos remete ao diálogo com as proposições de David Garland (2001) sobre as especificidades do controle social contemporâneo exercido modularmente.
13 Refiro-me inclusive ao controle das práticas homicidas que passou a ser exercido nas relações estabelecidas no “mundo do crime”, descrito por Feltran (2010).
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resultado de lutas entre tendências contraditórias e ambíguas da expansão/ contração do exercício dos direitos de cidadania por novas camadas sociais, da modulação das estratégias de controle social em formas duras e suaves, da expansão do controle estatal sobre a regulação dos conflitos interpessoais e econômicos sem a necessária expansão das fronteiras do Estado de direito14. É também o reflexo de uma reforma do Judiciário que se deu de modo centra- lizado, por emenda constitucional em 2004 e algumas alterações na legisla- ção processual, visando conferir alguma celeridade ao trâmite dos processos e visando aperfeiçoar mecanismos de controle administrativo – o que con- trastou claramente com as propostas de reformas mais radicais.
O que se vê desenhar mediante a análise da administração dos conflitos a partir do CIC é um campo estatal fragmentado, em que atuam diversas instituições e atores, com lógicas, tradições e inovações próprias, implemen- tando formas de administrar conflitos distintas. Essas formas distintas de administrar conflitos, contidas na esfera estatal de justiça, tensionam a apli- cação do direito estatal e a proteção dos direitos individuais em intensida- des diferentes. A intensidade de uso do direito para administrar conflitos é modulada no interior desse campo e tem se revelado rarefeita nas instâncias mais informais, como nas conciliações realizadas em atendimentos policiais e na mediação alternativa.
Os resultados da pesquisa apontam que as reformas nos serviços de jus- tiça ficaram muito aquém das demandas e necessidades de democratização do acesso à justiça formuladas na durante a democratização dos anos 1990- 2000. O projeto que nasceu sob a retórica de expandir os direitos e a cidada- nia à periferia acabou reduzido a oferecer serviços em que a administração de conflitos se baseia em um caráter rarefeito do uso do direito. Assim, se per- mite o deslizamento dos conflitos cíveis para a sua administração pela lógica do direito penal, sem as garantias formais devidas aos acusados. Permite-se a administração diferencial de conflitos familiares envolvendo relações de gê- nero muito hierarquizadas, sem modificar as distâncias hierárquicas, na con- tramão da retórica da Lei Maria da Penha. Permite assegurar parcialmente o exercício de direitos civis em conflitos que envolvem a circulação econômi- ca de micro escala, sendo esta a maior potencialidade dos serviços do CIC.
14 Estado de direito remete à ideia de respeito incondicional às leis e aplicação do direito estatal na administração dos conflitos.
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A lógica da gestão estatal de conflitos observada no CIC – nos diferentes serviços dos quais participam Poder Judiciário, Ministério Público e polícias – confere predomínio à administração de conflitos da circulação da riqueza (dívidas, pagamentos, pensões alimentícias), enquanto os conflitos relativos ao uso da violência física não são acolhidos ou tratados. A aposta dos idea- lizadores do CIC de que “levar a justiça à periferia” resultaria em modificar as lógicas da administração da justiça, que consideravam injustas e elitistas, não se concretizou.
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A Proppi - Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-graduação e Inovação da UFF realiza, nessa quarta-feira, dia 13 de dezembro de 2017, o III SEMINÁRIO DE ÉTICA E INTEGRIDADE CIENTÍFICA. A atividade é coordenada pelo antropólogo e pesquisador do INCT InEAC Fábio Reis Mota (PPGA UFF) e terá a participação de Luis Fernando Dias Duarte (UFRJ-Museu Nacional), Érica Quináglia (UNB), Patrice Schuch (PPGAS-UFRGS) e Maria Nélida Gonzáles de Gomez (PPGCI-UFF/IBICT UFRJ).
O seminário acontece no auditório da AGIR da Universidade Federal Fluminense, no terceiro andar do novo prédio da FÍSICA, no Campus da Praia Vermelha, em Niterói - RJ. O credenciamento será às 9:00h e a abertura está marcada para às 9:30h.
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