Pesquisa do INCT-InEAC analisa desigualdades na Justiça no atendimento a detentos durante a pandemia
A pandemia da Covid-19 expôs e aprofundou desigualdades em diversas áreas da sociedade, incluindo o sistema de justiça criminal. Um estudo coordenado pelo professor Roberto Kant de Lima, do INCT-InEAC, investiga como o Poder Judiciário e as políticas criminais em três estados brasileiros responderam às recomendações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para a proteção da saúde dos detentos durante a crise sanitária.
O projeto “Assimetrias federativas em tempos de Covid-19: Diagnósticos e impactos da recomendação CNJ nos Estados do Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul” reúne 22 pesquisadores de instituições como a Universidade Veiga de Almeida (UVA), Universidade Federal Fluminense (UFF), Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), além de colaboradores vinculados ao INCT-InEAC. A pesquisa analisa como a Recomendação 62 do CNJ, que orientava a adoção de medidas preventivas contra a Covid-19 nos estabelecimentos do sistema prisional e socioeducativo, foi aplicada nos estados estudados.
Selecionado pelo programa Impactos da Pandemia, da CAPES, o projeto faz parte de um conjunto de 40 iniciativas que buscam avaliar os efeitos sociais, econômicos e históricos da pandemia. Os primeiros resultados revelam que, apesar das diretrizes do CNJ, a manutenção das prisões foi a regra, enquanto a concessão de liberdade variou conforme o perfil do réu, reforçando desigualdades já presentes no sistema de justiça criminal brasileiro.
A pesquisa oferece subsídios importantes para futuras políticas públicas e reformas legislativas, contribuindo para um debate fundamental sobre a seletividade penal e o tratamento diferenciado de réus conforme seu status social.
A matéria completa foi publicada originalmente no portal da CAPES e pode ser acessada no link a seguir: Pesquisa analisa desigualdades na Justiça no atendimento a detentos.
Reproduzimos abaixo a reportagem na íntegra, com os devidos créditos ao site da CAPES.
IMPACTOS DA PANDEMIA
Pesquisa analisa desigualdades na Justiça no atendimento a detentos
Projeto da UFF examina a adoção da recomendação do CNJ e a efetividade na proteção da saúde dos encarcerados

Um estudo que envolve 22 pesquisadores identificou desigualdades na atuação do Poder Judiciário e nas políticas criminais em três unidades federativas brasileiras ao longo da pandemia da Covid-19. O levantamento evidencia que não houve, de forma igualitária, a adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus nos estabelecimentos do sistema prisional e do sistema socioeducativo, conforme recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O trabalho tem a participação de doutores, colaboradores e bolsistas de diversos programas de pós-graduação, especialmente da Universidade Veiga de Almeida, no Rio de Janeiro, Universidade Federal Fluminense (UFF), Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS) e Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), no Mato Grosso do Sul, além de pesquisadores ligados ao INCT-InEAC. Coordenado pelo professor Roberto Kant de Lima, o projeto “Assimetrias federativas em tempos de Covid-19: Diagnósticos e impactos da recomendação CNJ nos Estados do Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul” foi um dos 40 selecionados pelo Programa de Desenvolvimento da Pós-Graduação – Impactos da Pandemia, lançado pela CAPES em 2021. A iniciativa investirá até 2026 cerca de R$ 25 milhões na concessão de 353 bolsas de mestrado, doutorado e pós-doutorado e recursos de custeio em estudos relacionados aos aspectos sociais, econômicos, culturais e históricos decorrentes da pandemia.
Qual foi o objetivo do projeto?
A proposta do projeto é analisar as assimetrias federativas na apreciação de pedidos de liberdade de réus em razão da pandemia da Covid-19, nos casos de furto, roubo, tráfico e homicídio nas capitais dos estados do Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. O principal foco é a maneira como a Recomendação 62 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que solicitava a adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus nos estabelecimentos do sistema prisional e do sistema socioeducativo, foi recepcionada pelos Tribunais de Justiça desses estados.
Nosso objetivo geral é descrever e problematizar como as instituições judiciárias no Brasil internalizam e reproduzem desigualdades e assimetrias. O problema pode ser assim definido: se os juízes têm o dever de tratar as partes com igualdade, conforme estabelece a Constituição, como é possível que, na prática, sua atuação no processo leve à aplicação diferenciada da lei, desigualando o tratamento judicial aos cidadãos, em casos e circunstâncias análogos, em função de seu status social, reforçando a desigualdade jurídica? O recorte temporal da análise abrange o período de 2020 a 2022, comparando as concessões, ou não, de habeas corpus e estabelecendo uma comparação entre os períodos anterior, durante e posterior à pandemia.
O que você destacaria de mais relevante na pesquisa?
A relevância do projeto reside no mapeamento e descrição das debilidades e assimetrias do Poder Judiciário e das políticas criminais em diferentes unidades federativas, sobretudo no contexto da pandemia da Covid-19. O estudo examina a adoção da Recomendação 62 do CNJ e sua efetividade na proteção da saúde dos encarcerados por crimes de furto, roubo, tráfico e homicídio. O levantamento evidencia que não houve, de fato, uma ruptura das práticas punitivas tradicionais mesmo com a referida recomendação do CNJ.
Quais os resultados alcançados?
Embora o projeto esteja em andamento até dezembro de 2026, os resultados parciais permitem reflexões sobre o recorte pesquisado. Inicialmente, foi realizado um balanço de estudos acadêmicos sobre a atuação dos sistemas de segurança pública e justiça criminal frente à pandemia. A análise revelou que a aplicação da Recomendação 62 dependia da decisão de cada juiz. No entanto, a manutenção das prisões foi a regra, contrariando o esperado efeito da recomendação. Observamos também que os pedidos de liberdade com base na Recomendação 62 tiveram baixíssima aceitação para os casos de homicídio, roubo, furto e tráfico de drogas, enquanto foram amplamente concedidos para devedores de pensão alimentícia, evidenciando uma aplicação desigual da justiça.
De que forma esse trabalho pode contribuir com a sociedade?
A pesquisa ajuda a compreender as desigualdades estruturais e institucionais do sistema de justiça, fornecendo subsídios para futuras políticas públicas e reformas legislativas.
Qual a importância do investimento neste tipo de pesquisa?
O projeto revela não apenas o custo da desigualdade estrutural no Brasil, mas também os prejuízos decorrentes da negligência em relação à produção de conhecimento científico. A pesquisa contribui para a formação de pesquisadores e subsidia a formulação de políticas públicas mais justas e eficazes.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) é um órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
(Brasília – Redação CGCOM/CAPES)
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